Career Insights

Por Marcio Bogaz, Diretor de Finance Transformation da Serasa Experian

Desde o início da minha trajetória profissional, sempre fui movido por uma inquietação positiva: nunca aceitei os processos como eles se apresentavam a mim; sempre busquei fazer diferente — e melhor. Sempre questionei o status quo e procurei caminhos mais eficientes e inteligentes para resolver os desafios à minha frente.

O início da minha carreira, em uma trading de algodão, já evidenciava fortemente essa minha inclinação à transformação. Logo nas primeiras semanas, sugeri e implementei melhorias nas telas e nos relatórios da aplicação em Microsoft Access, que era utilizada no processo de classificação de algodão para os clientes, o que resultou na simplificação significativa da apresentação dos lotes pelo classificador. Pouco tempo depois, as portas se abriram para mim dentro do grupo.  Este foi o momento em que minha trajetória em Finanças começou — um início marcado pelo não conformismo e pela inovação.

Ao longo dos anos, essa inquietação se tornou um dos principais direcionadores da minha carreira, levando ao meu envolvimento em muitas iniciativas de transformação — desde pequenas melhorias e estruturação de rotinas até projetos de maior escala. Tive a oportunidade de participar de diversas iniciativas que ilustram essa jornada e liderá-las, vivenciando os principais marcos que a área financeira passou (e continua passando) ao longo dos anos: a implementação de ERPs, o avanço das plataformas de BI, a estruturação de Centros de Serviços Compartilhados, a digitalização dos meios de pagamento, o uso de RPAs (Automação Robotizada de Processos) e, mais recentemente, a incorporação da Inteligência Artificial.

A cada projeto, eu aprendia, de forma mais clara, que as transformações exigiam mais do que implementar sistemas automatizados. Hoje, na Diretoria de Finance Transformation da Serasa Experian, a maior datatech do país, tenho uma certeza: a tecnologia por si só não transforma. Em ambientes corporativos cada vez mais dinâmicos, os desafios são profundos e envolvem não apenas infraestrutura e processos, mas também — e principalmente — fatores humanos. As mudanças mais duradouras exigem o envolvimento ativo das pessoas, que são os motores propulsores, estratégicos e intelectuais por trás do funcionamento eficiente e eficaz da tecnologia.

Mas, então, como o profissional de Finanças pode se preparar para, de fato, estar à frente das evoluções da área e atuar como um player da transformação?

Flexibilidade para fazer diferente

Para que as mudanças aconteçam, os profissionais de Finanças precisam se preparar para o novo. Equipes financeiras com uma formação tradicional, que priorizam o conhecimento técnico, focando nos números, nos controles e na conformidade, precisam estar cada vez mais receptivas à incorporação de novas competências, como fluência digital, mentalidade ágil e adaptabilidade a novos contextos. Ao longo da minha carreira, sempre investi muito do meu tempo desafiando as equipes a mudarem a mentalidade — do fazer certo para o fazer certo, de forma diferente.

O profissional precisa estar aberto para reaprender e reconstruir as formas de trabalho. Muitos processos foram construídos diante de outra realidade tecnológica. Naquele contexto, o objetivo era a automatização dos processos; hoje, o desenvolvimento constante de novas tecnologias nos permite alavancar a flexibilidade e pensar em reconstruí-los do zero, de forma totalmente diferente.

Pensamento analítico para deliberar e decidir

As mudanças impactam a área de Finanças, exigindo dela um caráter mais eficiente e automatizado e menos operacional. A nova realidade abre espaço para o exercício de um papel financeiro cada vez mais analítico e capaz de prover, a partir dos dados, informações confiáveis e insights que ajudem suas organizações a tomarem decisões mais precisas e embasadas.

O potencial analítico que está sendo construído com o avanço veloz da tecnologia permitirá ao profissional de Finanças ocupar uma posição cada vez mais primordial no desenvolvimento da capacidade da empresa responder mais rápido às mudanças do mercado e mesmo alcançar maior previsibilidade.

Apesar dos avanços tecnológicos, especialmente da Inteligência Artificial, é importante lembrar que a tecnologia é uma ferramenta para potencializar o ofício e a cognição humana, e não para substituí-los. Ainda caberá aos seres humanos a responsabilidade de avaliar, refletir e tomar decisões. Quem souber explorar da melhor forma esses recursos tecnológicos, sairá na frente. Não saber usá-los poderá levar profissionais à estagnação.

Governança para gerir riscos

À medida que automatizamos processos, integramos novas plataformas e aplicamos Inteligência Artificial às decisões financeiras, surge o desafio de manter a conformidade regulatória e a segurança dos dados. Ataques cibernéticos e o risco de erros ou interpretações incorretas que sistemas automatizados podem gerar, por exemplo, exigem que a área de Finanças também assuma um papel ativo cada vez mais na governança da tecnologia.

Durante a adoção tecnológica, é essencial compreender os desafios do negócio e identificar quais necessidades a nova ferramenta pretende atender. Isso inclui acompanhar de perto o processo, avaliando riscos e impactos, e manter uma postura sempre crítica: validar, ajustar e entender as limitações dos modelos promovidos pelos métodos tecnológicos.

Diante das incertezas que a transformação pode gerar, a diligência e a atenção plena do profissional de Finanças são essenciais para identificar e gerir os riscos de um novo cenário. O monitoramento, o controle da situação e a gestão de riscos devem ser prioritários na agenda do líder financeiro. Alinhada a habilidades de planejamento estratégico e visão sistêmica do negócio, a área de Finanças pode atuar como uma agente de mudanças na criação de práticas de governança, processos e estruturas que mitiguem os riscos e garantam que os objetivos estratégicos da companhia sejam alcançados de forma ética, eficiente e sustentável.

Diante desse cenário, o papel da liderança financeira se torna cada vez mais flexível, analítico, conciliador e decisivo. Mais do que patrocinadores, CFOs e Diretores de Finanças devem ser protagonistas da transformação, promovendo a integração entre dados, pessoas e processos. Devem identificar na tecnologia, sobretudo, uma alavanca para agregar valor e construir uma visão de futuro para a função financeira — uma visão que vá além da entrega de relatórios e do fechamento contábil.