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Considerando as três dimensões ESG — Environmental, Social e Governance —, este último pilar, a Governança Corporativa, pode ser considerado a “zona de conforto” do CFO, uma vez que o conhecimento mais avançado nessa área já é, ou deveria ser, tradicionalmente exigido dos profissionais financeiros.

Nos últimos anos, o estabelecimento de práticas de Governança tem passado por transformações significativas, aprofundando a atuação da área de Finanças na condução da estratégia das empresas, com CFOs e suas equipes contribuindo para o fortalecimento dos instrumentos de controles internos, a fim de evitar crises financeiras e de confiança.

Agora, há mais exigências no horizonte. A CVM (Comissão de Valores Imobiliários) impõe que, a partir de 2026, as empresas de capital aberto apresentem relatórios ESG. Muitas companhias — mesmo as que não têm ações na Bolsa — já atuam para se enquadrar às exigências relacionadas a esses relatórios. Assim, a área financeira ganha ainda mais responsabilidades, com a necessidade de criação de indicadores exclusivos e de acompanhamento consistente das pautas ESG.

Com isso, o “G”, que nos últimos anos esteve predominantemente voltado a questões de criação de dispositivos antifraude e proteção da saúde financeira da companhia, está cada vez mais relacionado também à gestão das iniciativas socioambientais. E o ponto de partida para a consolidação da agenda ESG dentro dos escritórios tem sido a promoção da diversidade.

Diversidade e demais obrigações sociais

O pilar “S” (Social) do ESG está amparado principalmente pelas questões de diversidade. Dentro das empresas, a expectativa é que, nos médio e longo prazos, essa pauta avance para posições de liderança, partindo de uma base de colaboradores mais diversa. Para isso, as companhias precisam se preocupar não apenas em atrair talentos, mas também em retê-los.

Diante desse cenário, um dos primeiros passos para a implementação das iniciativas ESG é a reavaliação dos critérios de contratação e a adoção de uma abordagem mais paciente nos processos internos de desenvolvimento das lideranças. É frequente que competências que não foram exigidas no processo seletivo sejam impostas já no primeiro dia de trabalho do profissional, o que pode comprometer as ações de inclusão e desenvolvimento de talentos advindos de grupos sub-representados.

Se a disseminação das pautas ESG da porta para dentro das empresas encontra algumas resistências, da porta para fora, as dificuldades se avolumam. Ao longo dos anos, as corporações protagonizaram diversas catástrofes socioambientais causadas por suas políticas econômicas, tornando-se necessária a criação de condições de desenvolvimento sustentável que protejam a população e o ecossistema no entorno de sua área de atividade. 

Se as organizações podem ficar marcadas por protagonizarem problemas de grande magnitude, benefícios substanciais ao meio ambiente e às suas populações também podem ser atrelados ao nome das companhias de maneira permanente. Para tanto, os executivos podem contar com parcerias com organizações não governamentais, institutos privados, autoridades e sociedade civil, seja por meio de iniciativas pontuais ou convênios e consórcios para ações mais ambiciosas.

A presença do CFO na articulação desses projetos é fundamental. Com os números em mãos, o executivo financeiro pode orientar o caminho para o desenvolvimento de iniciativas que favoreçam a disseminação das pautas ESG dentro da companhia e fora dela, sem comprometer os resultados financeiros da operação. Nesse sentido, ele pode criar, liderar ou integrar comitês dedicados ao desenvolvimento de práticas sustentáveis e sociais, garantindo que a sustentabilidade esteja integrada à estratégia do negócio.

Indicadores

Para entender, de fato, como as iniciativas estão gerando resultados, a área de Finanças deve participar da criação e apuração de indicadores ESG. Assim, o executivo terá subsídios para identificar os custos de cada iniciativa e o retorno esperado para a empresa e a sociedade. Diante disso, o CFO tem uma atuação muito importante de centralização, avaliação, priorização e aprovação dessas iniciativas. Em seguida, ele pode passar os dados à área que vai implementar a ação, como a de Produtos ou de Projetos.

Nesse sentido, há desafios diferentes para cada vertical ESG. A mensuração das ações sociais, por exemplo, pode ser mais subjetiva e de cálculo mais complexo, especialmente pensando em como a organização pode se beneficiar dos resultados. Por outro lado, a questão ambiental parece mais avançada no sentido de descobrir o que é preciso fazer e qual é o retorno para a sociedade e a empresa. 

Se a mensuração do resultado não é tanto o problema em alguns casos, em outros, o êxito dessas iniciativas pode significar um entrave diferente para o CFO: a grande chance de essas ações reduzirem a lucratividade da empresa no curto prazo. A aceitação desse fator por parte de agentes do mercado requer uma mudança cultural drástica; caso contrário, será difícil incluir as demandas ESG às estratégias dos negócios de maneira estrutural e definitiva.

Instrumentos sustentáveis de financiamento

No Brasil, alguns executivos de Finanças afirmam que ainda são parcos os benefícios dados a empresas com projetos realmente sustentáveis. Essas companhias são submetidas às mesmas exigências com relação à lucratividade que outras que não têm na sua estratégia ações em ESG, o que desestimula a adesão a esse tipo de instrumento de financiamento, uma vez que os green bonds impõem exigências adicionais às empresas e cobram desempenho que as companhias não sustentáveis não precisam seguir. Dessa maneira, as organizações acabam assumindo sozinhas o alto risco inerente a projetos de inovação e sustentabilidade.

Diante disso, o desafio do CFO se torna ainda mais difícil, dado que ele ajuda na estruturação da dívida, além de participar da mensuração e dar transparência acerca das operações para o mercado. Indo além, o executivo de Finanças que acumula as funções de head de Finanças e de Relações com Investidores está incumbido de conversar com o mercado financeiro e demovê-lo da exigência por lucros a qualquer custo em troca de um projeto construtivo e de longo prazo do ponto de vista socioambiental. 

Por isso, é preciso haver uma mudança de mindset do mercado a partir de um entendimento por parte dos agentes de que as empresas são incapazes de conduzir sozinhas a consolidação de uma economia mais sustentável. O desafio é grande, mas não é insuperável, principalmente se os grandes agentes financeiros ajudarem na construção dessa nova cultura. 

O CFO e os novos desafios

Iniciativas como a inclusão de novas opções de financiamento com foco no desenvolvimento sustentável e relatórios obrigatórios de projetos relacionados ao tema ESG impõem ao CFO, que será excessivamente afetado por essas demandas, um aperfeiçoamento profissional no médio e longo prazos para esses temas. Ainda que, hoje, a demanda por executivos especializados em ESG não seja tão intensa (o que é um ponto a ser lamentado), no futuro próximo, as contratações de diretores, vice-presidentes e CEOs contemplarão necessariamente o conhecimento detalhado de estratégias de desenvolvimento sustentável.

No melhor dos mundos, pensando em desenvolvimento socioambiental, esses profissionais serão avaliados pelas companhias por sua capacidade de buscar os melhores instrumentos incentivados de financiamento, elaborar estratégias para desenvolvimento sustentável, montar equipes diversas, conversar com o mercado financeiro em termos de crescimento sustentável, bem como mensurar retornos — para a organização e para a sociedade — das ações em ESG estruturadas tanto da porta para dentro quanto da porta para fora da empresa.

Diante disso, as instituições de ensino serão demandadas para que cursos que tradicionalmente formam CFOs e CEOs abordem, em suas principais matérias e módulos, o tema ESG em toda sua profundidade e relevância. Ainda assim, o aprendizado acadêmico não substituirá uma realidade que o CFO já conhece: o que mais ensina é o dia a dia de trabalho. Portanto, os atributos em ESG que as empresas do futuro cobrarão dos executivos devem começar a ser desenvolvidos pelos profissionais no presente.