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Relatórios de sustentabilidade: novas exigências ao CFO

O plano de transformação ecológica do governo estimulou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a lançar, em 2023, uma resolução que obriga companhias de capital aberto a publicarem relatório com informações financeiras relacionadas às pautas ESG. Assim, as empresas listadas na bolsa devem apresentar as informações anualmente. A entrega será voluntária em 2025 e compulsória a partir de 2026.

Nesse contexto, empresas que operam na bolsa ou mesmo aquelas que não abriram capital se movimentam para atender às novas exigências, com participação direta da área de Finanças. Na Irani Papel e Embalagem, listada na B3, o CFO e sua equipe têm feito o diagnóstico para ver o que precisará ser adaptado em seus comunicados ao mercado para adequação às novas demandas.

Odivan Cargnin, CFO e Diretor de Relações com Investidores da Irani, avalia que o caminho tende a ser facilitado pelo fato de a empresa já publicar relatos integrados desde 2020 e o relatório de sustentabilidade desde 2006. “São anos já emitindo relatórios auditados sobre o tema. A gente tem todos os dados e, agora, é uma questão de adequação à nova regulação que possa refletir nas demonstrações financeiras. E não deve ser algo tão complexo, uma vez que a gente já tem um nível de maturidade bem elevado”, diz o executivo.

No caso da OceanPact Serviços Marítimos, foi criado um grupo de trabalho para entender com mais precisão a nova demanda. Segundo Eduardo de Toledo, Diretor Financeiro e de Relações com Investidores da OceanPact, ainda há pontos dúbios que precisam ser esclarecidos junto aos órgãos reguladores e às autoridades. Ainda assim, ele avalia a obrigatoriedade como “uma mudança importante”. Nesse sentido, a companhia da qual faz parte tem a vantagem de já estar no segundo ano de publicação de seu relatório integrado de sustentabilidade.

Carlo Ruggeri, CFO da Almaviva do Brasil, empresa de tecnologia e outsourcing de serviços de atendimento, explica que a organização tem metas internas e é interpelada pelos clientes, em sua maioria bancos, para que apresente dados sobre ESG.

Destaques da nova norma da CVM de apresentação obrigatória do relatório ESG:

  • O documento seguirá duas normas, IFRS S1 e IFRS S2, padronizadas pelo International Sustainability Standards Board (ISSB);
  • Os padrões visam a proporcionar informações sobre riscos e oportunidades ligados à sustentabilidade (S1) e clima (S2);
  • A ideia é dar informações completas e úteis para stakeholders na tomada de decisões nas relações que eles mantêm com empresas de capital aberto;
  • As principais divulgações requisitadas englobam tópicos como: governança, estratégia, gestão de riscos, métricas e metas relativas à sustentabilidade;
  • O propósito é estimular a alocação de recursos em projetos sustentáveis e aumentar a transparência quanto aos riscos para quem cogita investir em projetos com maior impacto ambiental.

Fontes: CVM e Ministério da Fazenda

Desafios de alocação de recursos para a área de Finanças

As novas exigências podem ajudar os negócios a construírem processos mais precisos, que ajudem não só os órgãos competentes e a sociedade a entenderem quem está seguindo as demandas por um desenvolvimento sustentável, mas também as empresas, especialmente suas áreas de Finanças, a definirem melhor quanto de dinheiro, tempo e esforço humano precisará ser alocado para que a companhia entregue ações ao mesmo tempo sustentáveis e rentáveis.

Para José Simão, que já foi Diretor de Planejamento Financeiro da BRK Ambiental e CFO e Diretor de Relações com Investidores da AES Brasil, ter metas facilita. “Torna-se uma discussão mais simples e sempre pautada na entrega final, que passa por entregas intermediárias”, detalha o executivo.

Já Toledo, da OceanPact, diz que as demandas por gastos adicionais, atreladas ou não às pautas ESG, sempre precisam de um esforço de análise detalhado da área de Finanças. Para ele, “a dimensão do retorno econômico é importante, quando é possível calculá-lo, de fato”. Nesse aspecto, uma das suas missões como CFO é instigar o restante da empresa a pensar outras formas possíveis de tocar os projetos, com volume de recursos menor.

ESG como estratégia

No caso da Irani, as pautas ESG estão todas atreladas à estratégia da empresa, tendo em vista que a companhia produz embalagens à base de papel, que são apontadas como mais apropriadas do que as de plástico para reduzir problemas no pós-consumo. Além disso, a empresa está inserida na economia circular, via reciclagem, garantindo que 70% das fibras das embalagens de papel que produz são recicladas. Os 30% restantes são provenientes de florestas replantadas. Ademais, a organização afirma que toda energia utilizada é limpa.

E não são apenas as empresas que têm soluções mais sustentáveis no seu core business que estão colocando o tema ESG como estratégico. Para Ruggeri, da Almaviva, as demandas por sustentabilidade estão mudando o planejamento das companhias de forma geral. Ele afirma que “a entrada do tema sustentabilidade colocou as empresas nos médio e longo prazos de novo. É verdade que, paralelamente, tem o desafio econômico e financeiro que ainda hoje está muito centrado nos curto e médio prazos. Mas a sustentabilidade acompanha o percurso da empresa. E não será nesse prazo pequeno que se conseguirá, por exemplo, reduzir algo como 30% do consumo de energia da companhia”, diz o executivo da Almaviva.

Novas demandas para o CFO e mensuração de resultados

Com as novas exigências, especialmente as relacionadas às emissões de relatórios obrigatórios, Toledo, da OceanPact, diz que a rotina do CFO pode ganhar novas atribuições. Alguns pontos que o executivo da área precisará compreender incluem o processo de medição das emissões de gases de efeito estufa e o tipo de metodologia utilizada, além de como essas informações são coletadas e da segurança e qualidade dos dados reunidos.

Para o CFO da OceanPact, esse trabalho pode requerer algum esforço de aprendizado e adequação da rotina de trabalho. Além disso, para a área de Finanças, “pode haver a necessidade de aumento de funcionários, porque isso gerará demanda adicional às atuais, além de custos extras”, avalia.

José Simão diz que o cálculo do retorno das iniciativas ESG ainda é um assunto com mais perguntas do que respostas e que os executivos devem estar atentos aos melhores cases para entender quais indicadores utilizar na medição da eficácia dos projetos. Segundo o executivo, mensurar os resultados na questão Social é um desafio ainda maior e que necessita de indicadores qualitativos.

As novas normas da CVM obrigam uma maior transparência e precisão na divulgação de informações, reforçando a necessidade de ajustes finos entre as metas ESG e a saúde financeira das empresas. Nesse cenário, o papel do CFO se torna ainda mais crucial para garantir que a empresa se adapte às novas exigências sem comprometer o seu crescimento, alinhando-as a um planejamento estratégico integrado que concilie sustentabilidade e rentabilidade.